O
juiz da Central de Inquéritos de Teresina, Valdemir Ferreira Santos, revogou a
prisão domiciliar e as medidas cautelares da empresária Francisca Danielly
Mesquita Medeiros, acusada de manter a afilhada em situação análoga à de
escrava por 15 anos em Teresina. Ela estava sendo monitorada por uma
tornozeleira eletrônica.
Francisca
Danielly foi presa temporariamente no dia 23 de maio e teve a prisão preventiva
decretada três dias depois. Ela teve o direito a prisão domiciliar para cuidar
do filho, um menino de 10 anos com autismo severo, e de seu filho caçula, de 8
anos.
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Montagem - Francisca Danielly Mesquita Medeiros (à esquerda) é suspeita de manter a afilhada, Janaína dos Santos (à direita), em cárcere privado e situação análoga à escravidão — Foto: TV Clube |
Na
decisão de soltura, o magistrado destacou que o representante ministerial
afirmou que, da forma como foram narrados os fatos, o delito supostamente
cometido é o crime de redução à condição análoga à de escravo, caso que compete
à Justiça Federal processar e julgar os autores do delito previsto no art. 149
do Código Penal, haja vista a violação aos direitos humanos e à organização do
trabalho.
O
juiz se declarou 'absolutamente incompetente para processar e julgar o crime de
redução à condição análoga à de escravo' e deferiu o pedido de revogação da
prisão domiciliar e medidas cautelares impostas à investigada Francisca
Danielly Mesquita Medeiros.
A
vida da jovem mantida em cárcere
Mantida
em cárcere privado, situação análoga à de escravidão e sendo agredida quase
diariamente durante 15 anos, Janaína dos Santos, de 27 anos, não se lembra da
data em que faz aniversário, nunca ia ao médico quando sentia dor, nem podia
ter amigos ou sair de casa quando quisesse.
A
jovem foi tirada de casa aos 12 anos durante um feriado da Semana Santa,
inicialmente, apenas para passar alguns dias com a madrinha em Teresina.
Ela
vivia com os pais e seis irmãos mais novos na cidade de Chapadinha, no
Maranhão, para onde nunca mais voltou. Começou então uma rotina de escravidão,
agressões, ameaças e perda de qualquer liberdade.
Ela
contou que era impedida de sair de casa e fazer amizades e era obrigada a
realizar todas as tarefas domésticas na casa de Danielly, sem qualquer
remuneração.
"Nunca
recebi salário, sempre vivi sem ajuda, nem pra comprar roupa, ela não me pagava
um centavo. [Para comprar produtos de higiene pessoal] eu pedia ao companheiro
dela, ele me dava dinheiro pra eu comprar. Eu recebia tudo usado, ela só me
dava quando não prestava mais", relatou.
Segundo
ela, o que fazia em casa nunca estava bom. Era sempre tratada como
preguiçosa e, quando a dona da casa não estava satisfeita, a agredia.
"Ontem
mesmo ela falou tanto nome que doeu meu coração, e eu nunca respondia ela, ela
me xingava, mas eu não xingava, não dizia nada. Eu não tinha amigos, não podia
sair, a última vez que saí foi segunda-feira, mas ela tomou minha chave, me
punia. Eu só saía pra comprar coisas e voltar pra casa. Eu sentia tristeza,
chorava sozinha, não gostava da minha vida. Pedia a Deus que me tirasse
dali", contou.
Entre
as violências, ela também não podia sair sequer para ter acompanhamento médico
quando precisava e nunca realizou consultas ginecológicas.
Janaína
disse que nunca foi a um hospital, mesmo quando sofreu com crises de cólica
renal, que causam dores intensas. "Ela me dava uma dipirona pra eu me
sentir bem, mas no médico nunca fui", relatou.
Janaína
estudava enquanto vivia na casa dos pais, mas desde que veio para Teresina
nunca mais foi à escola, não aprendeu a ler e escrever nem teve qualquer
convivência com outras crianças ou adolescentes. A jovem contou que, agora, a
vontade que tem é de voltar a estudar.
O caso dela ainda está sendo investigado pela
Polícia Civil do Piauí, que deverá concluir o inquérito nos próximos dias.
Enquanto isso, a acusada está presa preventivamente em uma unidade penal do
estado, à disposição da Justiça. Do G1 Piauí