A delação premiada de Anderson Castelo Branco, então
engenheiro-fiscal da Secretaria de Transportes do Piauí (Setrans), deu indícios
dos crimes de peculato, corrupção ativa, formação de quadrilha e fraude em
licitações da obra do porto de Luís Correia, no litoral do Piauí. Ao todo são
12 os denunciados pela Justiça, entre eles três ex-secretários do governo do
estado, servidores públicos e empresários. A iniciativa já custou mais de R$
390 milhões aos cofres públicos.
Maresia já provocou a oxidação das estruturas de ferro já utilizadas na obra do porto (Foto: Kleber Nogueira) |
O Piauí é o único estado litorâneo brasileiro sem porto. O
projeto de construção do primeiro terminal marítimo começou ainda na década de
1960 e as obras foram iniciadas em 1976. Mas, após 40 anos, o Porto de Luís
Correia é apenas um cais abandonado, de estrutura deteriorada, onde repousam
materiais e maquinários enferrujados. O Ministério Público Federal fez
investigação que apontou uma série de irregularidades e em agosto de 2014 a denúncia
foi aceita pela Justiça Federal.
O primeiro documento a ser postado no acompanhamento
processual do site da Justiça Federal citando a delação foi uma decisão do juiz
José Gutemberg de Barros, de Parnaíba, vara onde corre o processo, foi
publicado no sistema eletrônico em 1º de junho deste ano.
Trecho da delação premiada que consta em documento do MPF (Foto: Reprodução) |
Constam cerca de 20 citações à delação premiada de Anderson
Castelo Branco, sobretudo aos ex-secretários de transportes do Piauí Luciano
Paes Landim, Alexandre Nogueira e Norma Maria da Costa Sales e do
ex-superintendente de obras da Setrans Marlus Fernando de Brito Melo.
Eles e mais outras nove pessoas respondem por supostos
crimes cometidos na construção do Porto de Luís Correia, construção iniciada há
40 anos. Em maio de 2013, o G1 mostrou toda a cronologia da polêmica obra que
já custou mais de R$ 390 milhões aos cofres públicos e está parada desde 2011.
Contra Luciano Paes Landim, o delator informou em juízo que
o gestor tinha conhecimento que a empresa Staff, que tocava as obras no porto,
estava sendo paga sem que os serviços estivessem sendo realizados. “Luciano e
Marlus tinham conhecimento de que as obras eram atestadas sem sua realização e
que entendiam ser a única forma de pagar as obras realizadas pela construtora",
disse Anderson.
Sobre o então secretário Alexandre Nogueira, o juiz federal
José Gutemberg de Barros afirma que a deleção reforçou os indícios de que o
gestor determinava que fossem feitas medições falsas sobre a obra, o que
fundamenta a tese de que houve superfaturamento da obra.
“Que já conversou com o Marlus e o Alexandre sobre essa
questão, sendo que o último visitava diretamente a obra, de forma que afirma
que o mesmo tinha conhecimento técnico para entender esse procedimento",
diz trecho da decisão judicial que cita a delação.
A reportagem procurou Alexandre Nogueira e tentou por várias
vezes contato telefônico com ele, mas não obtivemos retorno.
Norma Maria também foi citada pelo delator como conhecedora
dos boletins com dados falsos. "Que a Norma conhecia esse procedimento
desde o momento em que fora diretora, pois nessa época já era responsável pelos
instrumentos; que, inclusive, a segunda etapa da obra foi renegociada na sala
da Norma e que, nesta oportunidade, inclusive, alertou sobre essas impropriedades,
especialmente por estar constando coisa ainda do primeiro contrato neste
segundo". O G1 não conseguiu localizar Norma Maria.
O MPF acusa o ex-superintendente de obras da Setrans Marlus
Fernando de homologar boletins de
medição apontados como falsos, indício de suposta existência de
superfaturamento da obra. “Eram de pleno conhecimento do Superintendente de
Obras Marlus Fernando".
O G1 conseguiu falar com o ex-superintendente de obras
Marlus Fernando, no entanto, ele disse que não irá comentar sobre as
informações dadas pelo delator e nem se posicionar sobre o processo em que é
denunciado.
O delator Anderson Castelo Branco também é acusado de
participar do esquema criminoso, em que teria contribuído em licitações
direcionadas e fraudes para o desvio de dinheiro público. Em troca de ele
contar o que sabe sobre os crimes, o suspeito pode ter sua pena reduzida em até
2/3, em caso de condenação.
A reportagem procurou o delator, mas ele também não foi
encontrado para comentar o fato.
A decisão do juiz José Gutemberg reitera que 12 dos 13
denunciados pelo MPF continuam respondendo por vários crimes como peculato,
corrupção ativa, formação de quadrilha e fraude em licitações. Todos os
acusados pediram para serem retirados do processo sob as mais diversas
alegações, mas apenas um foi excluído dos autos.
Procurador Kelston Lages, responsável por denunciar irregularidades (Foto: Catarina Costa / G1) |
Segundo o procurador federal Kelston Lages, a deleção
premiada de Anderson estava sob segredo de Justiça até o início deste ano,
quando ela foi homologada pela Justiça e ganhou domínio público.
“O acordo de delação vem desde 2014, mas por várias manobras
dos advogados de defesa, a audiência em que o Anderson daria seu testemunho
para a Justiça foi sendo adiada (por dois anos) até que foi realizada apenas no
dia 26 de janeiro”, disse.
O Ministério Público Federal, que acusa os crimes na obra do
porto de Luís Correia, afirma que foram gastos cerca de R$ 16 milhões em dois
contratos com empresas que fazem parte do esquema fraudulento. O MPF alega que
encontrou graves irregularidades como: licitação direcionada, superfaturamento
e até a falta de estudos de viabilidade técnica.
Mais de R$ 390 milhões já foram gastos |
Após a constatação, o MPF abriu duas ações: uma de natureza
criminal e outra de improbidade administrativa. O objetivo é o ressarcimento de
R$ 14 milhões em recursos ao erário, equivalente a soma dos dois contratos de
construção do porto.
A delação premiada de Anderson Castelo Branco foi realizada
para o processo penal, mas o procurador quer levar as informações prestadas
pelo engenheiro também para processo administrativo.
“Queremos que a delação também sirva de subsídio para o
processo que apura a improbidade. Não faz sentido fazermos um novo pedido de
delação e a pessoa tenha que fazer tudo de novo. O juiz ainda não julgou essa
demanda”, completou Keston.
Edição: parnaibapontocom
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